sexta-feira, 26 de junho de 2009

Trote de elite

escrevi em 2007..

À medida que se aproxima o fim do ano, cresce a pressão em torno do vestibular. Milhares de estudantes irão prestar as mais diversas faculdades por todo o Brasil, e a necessidade de estar cada vez mais preparado diante da crescente competitividade das provas, assombra a cabeça dos adolescentes gerando uma cobrança excessiva e prejudicial por parte da família, da escola e até mesmo do próprio aluno. Como se não bastasse, o aluno que consegue vencer essa difícil etapa precisa ainda passar por um outro teste de aptidão o qual não avalia qualquer capacidade individual do ingressante, e sim a sua tolerância em aceitar as mais variadas humilhações de caráter preconceituoso, exercidas pelos chamados “veteranos”.

Entrar na faculdade deixou de ser uma conquista pessoal a qual devemos ter orgulho, pois o ingressante após ser exposto a todo tipo de situação constrangedora, vê-se agora sem identidade, pois nos próximos seis meses deixará de ser gente para ser “bicho”, uma espécie de cobaia com a desconcertante função de “bobo da corte” dos “veteranos”.

Não posso deixar de fazer um paralelo com o filme “Tropa de Elite”, o qual polemiza os métodos utilizados pela polícia para fazer valer a lei na cidade do Rio de Janeiro. A situação em que se encontra a segurança pública da cidade evidencia a necessidade de medidas mais drásticas para controlar a força exercida pelo crime organizado, desde que essas medidas façam valer o direito do ônus da prova (todo cidadão é inocente até que se prove o contrário) e não sejam aplicadas de forma preconceituosa punindo indevidamente os moradores das favelas e morros.

A situação se agrava na hora de comentar os casos de torturas usadas pelos protagonistas. Esse crime hediondo foi colocado em um contexto o qual nos faz acreditar que os resultados obtidos fazem valer os métodos empregados, o que não é verdade, já que tortura (usada no filme até contra crianças) é crime, e deve ser punida adequadamente e não enaltecida.

Vocês devem estar pensando qual é a relação existente entre o filme e os trotes dos vestibulares, e é aí que chegamos então ao ponto mais alto dessa coluna: o preconceito. Em ambos os casos o preconceito é considerado uma prática aceitável, o que não deve acontecer.

Em um país onde se luta por mais igualdade, permitir que práticas preconceituosas sejam exercidas publicamente sem punição é negar todo um conjunto de conceitos que regem uma melhor convivência entres os seres humanos, é nossa obrigação exigir das autoridades represálias a tais condutas.


quarta-feira, 24 de junho de 2009

A lista de Schindler


Não é só mais um filme feito para lembrar o sofrimento judeu nas mãos dos nazistas. Seu conteúdo é repleto de senas chocantes como qualquer outro desse tema, porém é preciso analisá-lo sobre uma outra perspectiva, fazer uma análise humanística detalhada procurando balancear o significado das atitudes do protagonista e relacioná-las ao conflito pessoal entre ganância e solidariedade, que marca toda a trajetória da personagem, e ainda ao contexto de guerra daquele período.

Em plena Segunda Guerra Mundial, Schindler, Alemão e membro do partido nazista, identifica uma forma de ganhar dinheiro se aproveitando das necessidades que a guerra traz. Nesse sentido decide abrir uma fábrica de produção de panelas e outros utensílios relacionados à guerra para vender ao exercido alemão. O que torna essa proposta tão chamativa é o fato que de ele pretende usar mão-de-obra judia que, naquele momento, tem um valor agregado quase que insignificante mesmo para os cargos especializados.

Chegamos então à primeira questão que deve ser analisada cuidadosamente: explorar a mão de obra de um povo de forma quase escrava aproveitando-se da situação a qual esse povo foi submetido não é, nem de longe, uma atitude plausível. Em circunstâncias normais rotularíamos tais atitudes como desumanas, cruéis e etc. O que as tornam legitimas é que naquele momento era preciso dar uma utilidade para os judeus, para que eles não fossem assassinados pelo regime nazista.

Mas isso não justificaria pagar baixos salários e oferecer péssimas condições de trabalho certo? Como resposta, convido-os a uma reflexão: Naquele momento a condição de judeu era ideologicamente de inferioridade, e a outra opção era os mesmos moldes de trabalho nos campos de concentração, onde não era oferecida qualquer remuneração e o pagamento era considerado como o direito a vida.

Com o desenrolar do filme notamos que o cerco em torno dos judeus piora a cada cena, e a percepção é de que a qualquer momento todos vão ser levados para serem mortos nos campos de concentração. Quando chegam as ordens de eliminar todos os judeus possíveis e as medidas diplomáticas tomadas por Schindler não surtem mais efeito para a conservação da vida dos seus operários, este gasta toda a sua fortuna em subornos para comprar o direito de manter àqueles trabalhando.

E essa é a segunda e mais importante questão: ao abrir mão da ganância e de toda ideologia nazista para salvar os judeus, nossa personagem dá uma lição de humanização que extrapola a questão do sofrimento judeu. Olhando criticamente podemos traçar um paralelo com alguns problemas sociais atuais como a marginalização e péssimas condições de vida nas favelas, o abuso do poder pelas policias e a própria questão do preconceito com minorias étnicas e religiosas. A humanização está expressa nessa comparação, na necessidade de qualidade de vida que devemos atentar aos nossos desfavorecidos.

É um filme antigo que nos traz uma reflexão tão atual quanto à crise econômica global, pois em um mundo onde se capitaliza os próprios sentimentos, o drama traz a necessidade de recuperação de valores que vão alem de uma ideologia. É como um grito para que comecemos a agir como seres “humanos” em um mundo globalizado e evoluído tecnologicamente onde ainda há miséria e fome.